Preparação e aplicação dos aprestos e do leme

O forro do convés está completo e foi convenientemente polido. Aplicou-se na amurada, isto é, na borda interior do navio, um revestimento com tábuas de bétula sobre o 1º forro de marupa. Uma vez que os modelos não vão ser pintados, decidiu-se que se poderia realçar alguns pormenores da embarcação diversificando as tonalidades da madeira. O mogno contrasta muito bem com a bétula e, como tal, aplicou-se um cintado de mogno à embarcação. A cinta corre longitudinalmente o navio e na meia nau desce substancialmente abaixo do nível do convés produzindo um arrufamento acentuado das linhas do casco.

Aplicação dos trincanizes em madeira de mogno. Os trincanizes são madeiras colocadas no interior do navio, em cada bordo, sobre o forro do convés, contra as aposturas. Neste caso as aposturas, que são o prolongamento das balizas acima do convés, serão colocadas posteriormente.
A nossa frota de canoas da picada posa solenemente para a fotografia antes do início das férias. (Esta foto reporta à última sessão do curso antes das férias de Verão de 2009). Algumas embarcações estão ligeiramente mais adiantadas do que outras, mas, este ano, não vai ser possível rumar ao merecido descanso a bordo das mesmas. Os cintados estão prontos e nalguns casos as aposturas já vão em fase avançada de colocação. Quando se coloca a apostura sobre o trincaniz deve-se ter o cuidado de lhe dar um corte adequado no pé, no sentido de dar a ideia de que a apostura atravessa o trincaniz em vez de assentar sobre o mesmo. Coloca-se as aposturas com uma margem significativa acima do forro, margem que será removida posteriormente. A apostura fica “entalada” entre o trincaniz e o talabardão, que é a tábua que faz o remate da borda do navio e que é também designada por alcatrate ou corrimão da borda.
Esta canoa regressou de férias com as aposturas devidamente colocadas e com um magnífico talabardão de mogno oriundo das Onduras. Este talabardão foi realizado com três ripas de mogno com 3 mm de secção em quadrado justapostas no sentido longitudinal. Começa-se por colar a ripa central sobre o forro da borda e, uma vez que a mesma esteja fixa, coloca-se, de cada lado, as ripas adjacentes. Quando a cola seca passa-se com uma lixa em toda a extensão do talabardão e fica-se com a ideia de que se trata de uma tábua inteira que corre a borda de popa à proa. Nesta imagem pode-se ainda verificar o pormenor do trespassamento das voltas do forro do convés.

Preparação do leme. Começou-se por fazer um gabarito do leme a partir dos planos. As dimensões finais do leme tiveram de ser revistas, pois foi necessário aumentar a altura da quilha do modelo. Para o efeito fez-se um novo gabarito em contraplacado, o qual vai servir para testar a configuração final do leme. Na canoa da picada o leme trabalha por dentro do navio, sendo que a cachola ou cabeça do mesmo atravessa o casco e sobe acima do convés. O leme é composto por três peças de mogno com a madre a encostar ao cadaste. A porta do leme prolonga a madre em relação à ré e é sobre a primeira que se exerce a pressão da água quando se encontra desviada da posição média. Na madre do leme abrem-se uns entalhes que o Livro da Fábrica das Naus, escrito por Fernando Oliveira em 1580, denomina “encarnas”. “ E para ajuntar bem o leme com o codaste, fazem no leme encarnas, nas quaes entram as ferneas a tomar os machos, que ficão metidos nellas. E se fezessem estas encarnas no codaste, enfraqueceria, e quebraria, elle e toda a popa. E mays dobra o leme milhor assi, do que faria se teuesse as encarnas no codaste: por que daly com os beycos o estoruarião, que não dobrasse de todo.” Fernando Oliveira, Livro da Fabrica das Naos, Biblioteca Nacional de Lisboa – Reservados, cod. 3702, fol.163.
Pormenor sobre a cachola do leme atravessando o convés e pronta para receber a cana do leme.

O modelo já com a gaiúta e as escotilhas. Mantém-se o padrão decorativo, combinando o mogno com a bétula num trabalho cuidado e esteticamente bem conseguido. O leme ainda não foi fixado ao cadaste e uma mola mantém-no provisoriamente no lugar. A quilha, roda de proa e o cadaste foram revestidos com mogno sendo que houve o cuidado de simular correctamente os encaixes entre as respectivas peças.

Escoteiras das alhetas feitas com dois pedaços de mogno recortados e moldados a preceito. As peças encaixam por pressão, à justa, debaixo do talabardão.

Vista geral sobre um convés desafogado, com cunhos, escotilhas, gaiúta e escoteiras.

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